CONDOMÍNIO DE LUXO É CONSTRUÍDO EM TERRENO DISPUTADO NA JUSTIÇA, NUMA DAS ÁREAS MAIS CARAS DA CIDADE.

Desconsiderando os riscos de construir num terreno sub judice, uma das maiores construtoras do país ergue um conjunto de prédios de luxo na Barra da Tijuca.

O empreendimento Riserva Golf, anexo ao campo de golfe construído para os Jogos Olímpicos de 2016, está sendo construído numa área de 31 mil m2 que comportará 4 prédios de 21 e 20 andares.

O projeto foi concebido no bojo da misteriosa Parceria Público-Privada feita entre a Prefeitura do Rio de Janeiro, na gestão do Prefeito Eduardo Paes, com o falecido Pasquale Mauro e a construtora RJZ Cyrela.

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Imagem: livinggazette.com

Recentemente, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro suspendeu o pagamento de um multimilionário precatório aos herdeiros de Pasquale Mauro e Holophernes Castro sob a alegação de que o registro de propriedade de um terreno desapropriado pelo Estado do Rio de Janeiro na década de 60 era de origem duvidosa, decorrente da contestada e polêmica aquisição feita pelo Banco de Crédito Móvel.

A origem do duvidoso registro de propriedade do terreno desapropriado (Banco de Crédito Móvel) é exatamente a mesma dos terrenos em que a construtora edificou os empreendimentos Riserva Uno e, mais recentemente, o Riserva Golf.

A história da disputa fundiária foi transformada num longa-metragem que pode ser visto gratuitamente no Youtube.

 

 

Herdeiros de Pasquale Mauro cobram mais de 50 milhões de reais de indenização da Prefeitura do Rio de Janeiro

Herdeiros de Pasquale Mauro brigam na Justiça para receber uma indenização de mais de 50 milhões de reais da Prefeitura do Rio de Janeiro, em função da criação do Parque Natural Nelson Mandela, na Praia da Reserva.

Segundo o espólio de Pasquale Mauro, autor da ação, a operação urbana consorciada criada por iniciativa do ex-prefeito Eduardo Paes provocou a desvalorização dos “seus” terrenos.

A Prefeitura do Rio de Janeiro contestou os pedidos alegando que, só em relação aos terrenos supostamente desvalorizados, o espólio de Pasquale Mauro deve mais de 167 milhões de reais, ou seja, mais de três vezes o valor pretendido na ação indenizatória.

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Os autores da ação classificam a política do Município como “ardilosa”, acusam-no de pretender se “beneficiar de sua própria torpeza”, ao “extirpar em absoluto o potencial edilício de seu imóvel”, com o “objetivo escuso” de forçar a doação do imóvel, se apropriando do mesmo “a preço de banana”.

Os procuradores do Município, alegam que “ou os Autores não compreendem a legislação urbanística e desconhecem os instrumentos criados pelo Estatuto da Cidade, ou confundem negociação de potencial construtivo com a antiga atividade comercial que exerciam na Barra da Tijuca, ou estão mesmo agindo de má-fé”.

O Ministério Público do Rio de Janeiro ainda não opinou sobre o caso.

Sobre a questão de fundo que envolve a disputa das terras na região de Jacarepaguá e Barra da Tijuca, vale a pena conferir o Filme Olympia 2016, lançado pelo cineasta Rodrigo Mac Niven. O filme é um documentário ficção que aborda o fenômeno da corrupção, hoje, mais do que nunca, um tema nacional.

O filme é fruto de uma bem sucedida campanha de crowfunding e da articulação de um grupo de ativistas críticos à realização dos Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro, os quais conseguiram mobilizar 534 cidadãos apoiadores do projeto.

 

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Olympia 2016 no Facebook

Enquanto a grande mídia não deu destaque algum ao projeto e ao filme, em função de evidente conflito de interesses econômicos com os grande grupos empresariais do mercado imobiliário e organizadores dos Jogos Olímpicos, os jornais eletrônicos e sites independentes se encarregaram de divulgá-lo:

The Intercept Brasil: A CURIOSA SEMELHANÇA ENTRE CASOS CARIOCAS E AS HISTÓRIAS DO NOVO “DOCUFICÇÃO” OLYMPIA

Canal Brasil: Uma paródia sobre os escândalos da olimpíada em uma cidade fictícia. Ficção e documentário se encontram em filme de Rodrigo Mac Niven.

Glamurama: Filme que desvenda a corrupção nas Olimpíadas estreia no Rio

Rio On Watch: Olympia é um filme chocante, que mistura documentário e ficção ao explorar a natureza da corrupção durante a preparação para os Jogos Olímpicos de 2016.

 

 

 

 

 

 

 


[01] Fonte: Processo n.º 0298333-39.2016.2009.8.19.0001

 

PAGAMENTO DE PRECATÓRIO MULTIBILIONÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO É SUSPENSO PELA JUSTIÇA

O pagamento de um multibilionário precatório do Estado do Rio de Janeiro foi suspenso pela Justiça. A suspensão foi determinada pelo Presidente do Tribunal de Justiça do Rio, que teve sua decisão confirmada pelo CNJ.

O valor da fatura beira a estratosférica cifra de 1 bilhão de reais e é disputado pelos Herdeiros de Holophernes Castro e Pasquale Mauro, na condição de supostos sucessores do Banco de Crédito Móvel.

A suspensão foi motivada pela controvérsia acerca da titularidade do imóvel objeto da desapropriação, que corresponde a duas áreas hoje ocupadas pelo 31º Batalhão da Polícia Militar e FEEMA (87.639,00m2) e pelo laboratório da CNEN – Comissão Nacional de Energia Nuclear (75.748,00 m2).

Por decisão do Juiz EDUARDO ANTONIO KLAUSNER, da 7ª Vara de Fazenda Pública da Capital, no último dia 26/04/2018, o processo deverá aguardar o julgamento do Recurso Especial interposto pela Procuradoria do Estado do Rio de Janeiro.

No recurso apresentado pelo Estado, além de toda a argumentação técnica que embasa a decisão de suspensão do pagamento do precatório, há o entendimento de que as áreas desapropriadas, em verdade, sejam públicas!

Ou seja, considerando que a bilionária indenização decorre de desapropriação de áreas supostamente do Banco de Crédito Móvel, as chances de que isso realmente seja verdade são enormes, não se justificando a liberação do referido precatório até que passado a limpo essa história.

Fonte: Processo n.º 0000309-50.1962.8.19.0001 – TJRJ

Sobre a questão de fundo que envolve a disputa das terras na região de Jacarepaguá e Barra da Tijuca, vale a pena conferir o Filme Olympia 2016, lançado pelo cineasta Rodrigo Mac Niven. O filme é um documentário ficção que aborda o fenômeno da corrupção, utilizando como pano de fundo a grilagem de terras e o tráfico de influência de grileiros com autoridades públicas.

O filme foi fruto de uma bem sucedida campanha de crowfunding e da articulação de um grupo de ativistas críticos à realização dos Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro, os quais conseguiram mobilizar 534 cidadãos apoiadores do projeto.

 

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Enquanto a grande mídia não deu destaque algum ao projeto e ao filme, em função de evidente conflito de interesses econômicos com os grande grupos empresariais do mercado imobiliário e organizadores dos Jogos Olímpicos, os jornais eletrônicos e sites independentes se encarregaram de divulgá-lo:

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AS LUTAS PELAS TERRAS EM JACAREPAGUÁ E REGIÃO DAS VARGENS DURANTE O GOVERNO CARLOS LACERDA

No início da década de 1960, o Partido Comunista Brasileiro já havia adotado um rumo de total conciliação com os setores da burguesia nacional, seja do meio urbano quanto do meio rural. Mas ainda havia algumas forças conservadoras cuja aliança ou parceria era tida como inviável para o PCB. Uma delas era a UDN, especialmente a sua liderança maior – Carlos Lacerda. Era esta a figura a ser combatida, talvez o principal adversário político do PCB no âmbito do estado da Guanabara. A ele seriam dirigidos a partir do início da década de 60 os principais e mais intensos ataques, mais até do que ao “império ianque”.

Lacerda seria responsabilizado por todos os infortúnios vividos pela população carioca e o Novos Rumos (novo nome do jornal do PCB) tentava demonstrá-lo seja através de editoriais e reportagens ou de pequenas “homenagens”, como a que foi concedida na forma de uma música de autoria de Sarandy, leitor assíduo do jornal:

 

Nas eleições

quanto potoca,

mil ilusões

pro carioca

Hoje está vendo

o tempo perdeu,

e está sofrendo

quem te elegeu

A água sumiu

o “bicho” rendeu, o povo sentiu

e se arrependeu

Ao progresso

sois um estorvo,

filho da Esso

maldito Corvo

Ódio da farda

é tua sina

o rio da guarda

virou piscina

ódios internos

ódios antigos

crias infernos

mata-mendigos

(Novos Rumos, 06-12/09/63, p.6.)

Carlos Lacerda

As notícias sobre violências e crimes cometidos por grileiros contra lavradores cariocas seriam usadas pela imprensa comunista como um instrumento de afirmação do seu antagonismo em relação a Lacerda. Todos os problemas e desventuras sofridas pelo lavrador do Sertão Carioca eram, no final das contas, colocados da conta do “corvo da rua do Lavradio” (Esta era a rua onde se localiza até hoje o Tribuna da Imprensa, na época de propriedade de Lacerda), que agiria mancomunado com as companhias imobiliárias no crescente processo de especulação das terras da zona rural do Estado da Guanabara.

Exemplo disso foi a destruição das hortas de cem lavradores em Jacarepaguá por parte de policiais da vigilância sanitária. Sob o título “Polícia de Lacerda protege a ‘saúde da light”, o Novos Rumos desvendava os verdadeiros motivos “da invasão destruidora, com tôda a sua truculência de tipo fascista” da polícia. Alegava Lacerda que a destruição das hortas tinha se dado em função de preocupações com a higiene e a saúde da população, já que as hortas seriam regadas com águas de um riacho contaminado.

Na verdade, revelava o Novos Rumos, as terras pertenceriam à Rio Light S.A., que estaria disposta a expulsar os lavradores para poder alugar os lotes agrícolas a uma companhia:

É simplesmente o aumento do lucro imobiliário que o sr. Lacerda favoreceu, ao iniciar, na prática, a expulsão dos lavradores das terras da ‘Light’, destruindo suas plantações sem a menor indenização e sem qualquer informação aos lavradores sôbre seu futuro(…).

Talvez agora se torne mais compreensível porque tão grande número de escritórios eleitorais do sr. Lacerda localizava-se nos térreos de edifícios em construção”

 (Novos Rumos, 10-16/02/61, p. 6.).

Nessa mesma área seriam instalados anos mais tarde o Hospital Cardoso Fontes e a Fábrica de Papelão (hoje desativada e prestes a se tornar um shopping).

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CHARGE DE LACERDA DO ÚLTIMA HORA.

ACERVO: ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO.

Meses depois a polícia de Lacerda voltaria a “assinar ponto no sertão guanabarino”. Tal como em Jacarepaguá, aquele mobilizaria a polícia em Campo Grande para atender aos “negros propósitos” dos “tubarões de terra” numa nova “empreitada sinistra”:

“Cenas difíceis de se supor que ocorressem em longínquos rincões do interior, onde o coronelismo e o latifúndio impõem sua vontade, acontecem a menos de hora e meia de ônibus do centro do RJ.(…) com o conhecimento e a aprovação tácita do governador – (…) o aparelho policial se presta a violentar primários direitos de cidadãos pacatos, de quais não se conhece outra atitude que não o do trabalho, penoso e diuturno” (Novos Rumos, 11-17/08/61, pp. 1 e 6.).  

Segundo noticiava o Luta Democrática às vésperas do golpe de 64, uma “reforma agrária” estava prestes a ser “decretada” em Vargem Pequena (Jacarepaguá), mas não pelos seus 1.220 “posseiros” e sim “pelos velhos e conhecidos grileiros da região, antes abandonada e desvalorizada.” Por meio dessa “reforma agrária”(!) os “posseiros” estavam “sendo violentamente ameaçados de serem expulsos de suas terras” e ainda “perdendo suas benfeitorias”. Para sua implementação recorria-se aos serviços de capangas armados, “incumbidos de invadir as terras, abrindo fogo, a todo custo, como se aquilo fosse terra de ninguém”. E segundo jornal, tudo isso contaria com o beneplácito do poder público:

“Todas as queixas levadas às autoridades policiais, pedindo garantias, são recusadas ou postas na ‘geladeira’, porque o assunto é da alçada da Justiça … salvo se houver bala!

Já se verificaram casos em que os lavradores que vão pedir garantias ficam presos para averiguações.”

(Luta Democrática, 24/03/1964. p. 7).

Longe de serem vistos como um fenômeno distante e inexplicável, só apreendido pela matemática dos censos, os loteamentos eram considerados como sendo de autoria de “grileiros”, “ladrões de terras” e “aventureiros”, cujas práticas acarretavam inúmeros “malefícios ao abastecimento da cidade” e à “vida de humildes lavradores” e suas famílias. Ou seja, a expansão dos loteamentos sobre o Sertão Carioca se deu paralelamente à formação de uma importante arena de disputas em torno de valores e significados referentes a noções de direito e justiça. A existência de tal arena acabou sendo desconsiderada quando alguns estudiosos preferiram designar esse processo como “expansão do vetor urbano pela área rural” ou como Fânia Fridman preferia afirmar como “loteamentos promovidos em sua maior parte pelo setor imobiliário”. Mas na época em que esse processo se deu, ele era qualificado por alguns órgãos de imprensa como “repelentes assaltos de terras” praticados por “malfeitores encasacados”, ou, como contra-argumentavam as loteadoras, como a “chance sem igual de uma vida alegre” com “aplicação de capital seguro”, em terras “devidamente registradas e legalizadas”. E além de produzir novas ruas e casas, tal expansão concorreu para o surgimento de novas idéias, representações e certezas: dentre elas, foi-se consolidando a de que os infortúnios vividos pelos habitantes da região atendiam a interesses de um determinado grupo: enquanto a diminuição da produção agrícola acontecia, levando ao declínio das condições de vida dos lavradores e à falta de gêneros para o abastecimento da cidade, havia homens que faziam fortunas com ela.

Fonte: Carlos Lacerda e os posseiros de Jacarepaguá

Em 2016, o cineasta Rodrigo Mac Niven lançou o filme Olympia 2016, um documentário ficção que aborda o fenômeno da corrupção, utilizando como pano de fundo a grilagem de terras em Jacarepaguá.

O filme foi fruto de uma bem sucedida campanha de crowfunding e da articulação de um grupo de ativistas críticos à realização dos Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro, os quais conseguiram mobilizar 534 cidadãos apoiadores do projeto.

 

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Enquanto a grande mídia não deu destaque algum ao projeto e ao filme, em função de evidente conflito de interesses econômicos com os grande grupos empresariais do mercado imobiliário e organizadores dos Jogos Olímpicos, os jornais eletrônicos e sites independentes se encarregaram de divulgá-lo:

The Intercept Brasil: A CURIOSA SEMELHANÇA ENTRE CASOS CARIOCAS E AS HISTÓRIAS DO NOVO “DOCUFICÇÃO” OLYMPIA

Canal Brasil: Uma paródia sobre os escândalos da olimpíada em uma cidade fictícia. Ficção e documentário se encontram em filme de Rodrigo Mac Niven.

Glamurama: Filme que desvenda a corrupção nas Olimpíadas estreia no Rio

Rio On Watch: Olympia é um filme chocante, que mistura documentário e ficção ao explorar a natureza da corrupção durante a preparação para os Jogos Olímpicos de 2016.

 

 

 

O BANCO DE CRÉDITO MÓVEL E O MECANISMO DE GRILAGEM DE TERRAS NA BARRA DA TIJUCA

Reforçam a tese de que o Banco de Crédito Móvel não tenha passado de um mero instrumento para a prática de negócios jurídicos ilícitos os elementos colhidos no Arquivo Nacional que noticiam a existência do processo n.º SGI/GB-013/69, instaurado pela Comissão Geral de Investigações do Ministério da Justiça, de onde se depreende o elucidativo depoimento do PROCURADOR DO ESTADO DA GUANABARA – Dr. PAULO ROCHA LAGOA –, que, dentre outras coisas, afirmou que:

como é sabido, todas as terras do Brasil são de propriedade pública, eis que só saíam do patrimônio da Coroa Portuguesa mediante ato formal; que no caso, os atos apontados como geradores de domínio por parte do Banco de Crédito Móvel são insuscetíveis de comprovar essa situação jurídica; que todas as terras que não saíram validamente do patrimônio da Coroa Portuguesa, passaram para o Patrimônio do Império do Brasil; que estiveram durante todo o período do Império nas mãos do Governo Geral; que, com a Proclamação da República, passaram para o patrimônio dos Estados da Federação; que, entretanto, isso não aconteceu com as terras públicas (denominadas terras devolutas) situadas no território do antigo Distrito Federal, atual Estado da Guanabara; que a razão de continuar a União Federal com domínio sobre tais terras ocasionou-se do fato de não ser o Distrito Federal, como é evidente, uma unidade da federação; que, assim, entretanto, não era a situação jurídica quando da Promulgação da Constituição do Brasil de 1967, a qual encontrou configurada a existência do Estado da Guanabara; que, assim o Estado da Guanabara é atualmente o titular de domínio sobre as terras devolutas sitas no seu território; que, como as terras situadas na área da Baixada de Jacarepaguá não possuem titular válido, é ele, Estado da Guanabara, o proprietário das mesmas; que nesse sentido, o depoente teve oportunidade para manifestar-se no processo administrativo de número 2/01431/69 (dois/zero-mil quatrocentos e trinta e um/sessenta e nove), em o qual solicitou ao Excelentíssimo Senhor Doutor Procurador-Geral do Estado autorização, que lhe fora dada, para postular uma ação discriminatória de terras públicas contra Pascoale Mauro, qual se diz titular do domínio sobre uma faixa de terras sita na Baixada de Jacarepaguá, entre o mar e a Lagoa de Marapendi; que o motivo gerador desse pedido encontra-se no fato de ser destinada essa área, tanto no atual Projeto Urbanístico vigente, como no Projeto Lúcio Costa, para construir uma Reserva Biológica, a qual deve, por motivos óbvios, ser de propriedade do Estado; (…)”.

Em minucioso estudo, o citado Procurador Paulo Rocha Lagoa dissecou cada um dos títulos da cadeia sucessória do Banco de Crédito Móvel, demonstrando de forma irrefutável os vícios de cada um e, naturalmente, a invalidade da transcrição feita em seu nome:

“14. O PRIMEIRO TÍTULO – Não é necessário grande trabalho para se examinar esse documento, eis que se encontra transcrito no livro denominado “Termo das Cartas de Sesmaria de Terras, Chãos e Águas da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, dadas por Salvador Correia de Sá, Capitão e Governador da dita Cidade”, o qual se encontra no Arquivo Nacional, Seção de Documentos Históricos, classificado como código 778-1. Recentemente, o dito Arquivo Nacional publicou na íntegra esse Livro Tombo so a seguinte denominação:

Tombos das Cartas das Sesmarias do Rio de Janeiro (Rio, 1967), onde se encontra a fls. 38/42 a “Carta de Sesmaria e Águas de Martin de Sá e Gonçalo Correia de Sá que estão onde chama a Tiguga”.

Essa carta de Sesmaria (junta sob n.º 1) contém, inteiramente, transcrita a própria petição de autoria de Gonçalo Correia de Sá e Martin de Sá, a qual assim se descreve as terras objeto de solicitação:

uma dada de terra a que se chama Tiguga, que parte com os Padres JHUS e o Conselho desta Cidade…”

Isto é, as ditas terras confrontavam-se com as terras da sesmaria de propriedade da Ordem dos Jesuítas e com a sesmaria de propriedade do Senado da Câmara, ou seja, do governo local da cidade e que hoje constitui a denominada “Sesmaria Estácio de Sá”, que se encontra no patrimônio do Estado da Guanabara, por sucessão das pessoas jurídicas de direito público territorial (Município Neutro e antigo Distrito Federal) que se sucederam no local. O ponto é de grande importância, conforme abaixo se verá.

15. O Governador da Cidade, Salvador Correia de Sá, atendeu à solicitação dos requerentes, concedendo-lhes as terras em sesmaria. O instrumento da Carta foi muito explícito quanto às lindes do imóvel, bem como no que tange ao dever de medição das mesmas, o qual, conforme tivemos a oportunidade de assinalar no § 6º das presentes razões, acima, era um dos elementos formais para a validade do ato de concessão da sesmaria. (…)

Note-se que, logo em seguida, o referido instrumento de concessão da sesmaria afirmava que a outorga das terras era efetuada em conformidade com o Regimento do Governador Geral Antônio Salema[i], regimento esse que foi em seguida transcrito na parte relativa à forma pela qual se concederiam sesmarias, sendo ali feita expressa referência ao Livro IV das Ordenações, Título das Sesmarias (trata-se das Ordenações Manuelinas, então em vigor), como legislação disciplinadora da matéria.

16. A PRIMEIRA FALHA NA CADEIA SUCESSÓRIA – Encontra-se neste ponto a primeira falha na cadeia sucessória. Os titulares da sesmaria, não cumpriram com o dever de medição a que estavam obrigados. Esse dever (cuja importância era fundamental, a ponto de constituir uma das condições de validade da concessão da sesmaria) foi por eles completamente descurado, havendo, consequentemente, caído em decadência a sesmaria que lhes fora outorgada. Essa conclusão é inapelável. Os beneficiários da sesmaria perderam qualquer direito sobre as terras, face sua omissão em cumprir com o dever de fazer que lhes havia sido imposto.

17. A SEGUNDA FALHA NA CADEIA SUCESSÓRIA – A segunda falha na cadeia sucessória está na ausência de prova da forma pela qual o direito sobre a sesmaria acima referida (admitindo-se, meramente “gratia argumentandi”, não houvesse ocorrido o comisso por falta de medição) teria sido transmitido de Gonçalo Correia de Sá e Martim de Sá para o domínio de D. Vitória de Sá. Esta, muito estranhamente, no seu testamento, ao invés de mencionar e descrever o título de propriedade sobre a Baixada de Jacarepaguá, limitou-se a declarar, em seu testamento, que havia herdado ditas terras de seus pais e avós, sem se referir ao inventário dos mesmos e sua consequente partilha. D. Vitória de Sá, consequentemente, não possuía título algum sobre essas terras, podendo ser, quando muito, simples posseira das mesmas.

18. O SEGUNDO TÍTULO – O segundo título que é apresentado para formar a cadeia consiste no testamento da referida D. Vitória, o qual está publicado no volume denominado “Construtores e Artistas do Mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro”, de autoria do benemérito historiador Dom Clemente Maria da Silva Nigra (Salvador, 1950), a fls. 249/258. Neste documento, D. Vitória assim descreveu o imóvel que afirmou ser de sua propriedade:

Declaro que as terras desde o rio da Pavuna athe o mar e correndo a costa athe junto da Guaratiba com seus montes, campos, Restingas, Lagoas e Rios sam meios que os herdei de meus Paes e avos” (fls. 251).

É de assinalar-se, neste ponto, que por força da descrição efetuada nesse testamento, os limites das terras seriam o então Rio Pavuna, que desaguava na Lagoa de Jacarepaguá e desta até o mar, correspondendo aproximadamente com a descrição efetuada no ato de concessão da sesmaria primitiva, pois os limites das sesmarias de propriedade do Senado da Câmara e da Ordem dos Jesuítas efetivamente aproximavam-se da Lagoa de Jacarepaguá, conforme se pode verificar na planta apresentada em anexo como documento n.º 2, onde está lançada a medição que o Senado da Câmara fez efetuar de suas terras. A questão tem grande importância, como acima se verá.

19. A TERCEIRA FALHA NA CADEIA SUCESSÓRIA – Tal como foi assinalado relativamente à Gonçalo Correia de Sá e Martim de Sá, é de ver não existir qualquer prova da válida transferência de domínio (sempre se admitindo “gratia argumentandi”, que da o tivesse) de D. Vitória de Sá para o Mosteiro de São Bento. Onde se realizou o inventário dessa senhora e onde está o formal de partilha que deveria ter sido extraído? Essa terceira e não menor falha vai acumulando elementos comprobatórios do fato de se tratar do tremendo “grilo” o título apresentado pelo Banco de Crédito Móvel, em liquidação desde os bons tempos do encilhamento…

20. A QUARTA FALHA NA CADEIA SUCESSÓRIA – A quarta falha fiz respeito a uma questão da maior importância para o deslinde da matéria, consistente na incapacidade do Mosteiro de São Bento de herdar terras, por força do disposto nas Ordenações Filipinas, Livro II, Título XIII, a saber:

De muito longo tempo foi ordenado pelos Reis nossos antecessores, que nenhumas Igrejas, nem Ordens, pudessem comprar, nem haver em pagamento de suas dívidas bens alguns de raiz, nem por outro título algum os adquirir, nem possuir, sem especial licença dos ditos Reis, e adquirindo-se a dita defesa, os ditos bens se perdessem para a Corôa. A qual foi sempre até ora se usou, praticou e guardou em estes nossos Reinos sem contradição das Igrejas e Ordens e Nós assim mandamos que se guarde e cumpra daqui em diante”.

Especificamente no que tange as legados e heranças em benefício de entidades religiosas, o mesmo Título estabeleceu regra específica, a vigorar para o futuro, com a seguinte redação:

Porém, deixando alguma pessoa alguns bens em sua vida, ou por sua morte a alguma Igreja, Mosteiro, de qualquer Ordem e Religião que seja, em havendo-os por sucessão, podelo-há possuir por ano e dia, no qual tempo se tirará deles, não havendo nossa provisão para os possuir por mais tempo. E não se tirando no dito tempo, nem havendo nossa provisão, os perdera para Nós” (consulte-se Cândido Mendes, Código Filipino, cit. Pag. 435).

Ora, quando D. Vitória de Sá fez seu testamento, em data de 30.01.1667 (D. Clemente da Silva Nigra, Construtores e Artistas, cit. Pag. 250), já se encontravam em vigor as Ordenações Filipinas, datadas que são de 11.1.1603, as quais, consequentemente, governavam por completo seja a capacidade para testar de D. Vitória de Sá, seja a capacidade para herdar do Mosteiro de São Bento. Consequentemente, o dito Mosteiro se encontrava impedido de suceder nas terras da Baixada de Jacarepaguá, sendo-lhe lícito apenas ficar na posse das mesmas, isso mesmo, caso obtivesse autorização real para tanto, o que certamente não obteve, pois o seu historiador, o referido D. Clemente da Silva Nigra, naquela minuciosa obra, a tanto não faz referência, apesar de haver esmiuçado completamente o excelente arquivo do Mosteiro de São Bento. A conclusão é clara e insofismável: se as terras de D. Vitória de Sá não houvessem caído em comisso por falta de medição (o que já se viu no § 16º do presente, acima), de qualquer forma deveriam voltar ao patrimônio da Corôa pelo fato de não se lícita a herança com que o Mosteiro de São Bento foi beneficiado.

21. O TERCEIRO TÍTULO – Este título é a escritura de compra e venda, passada pelo Mosteiro de São Bento à Companhia Engenho Central de Jacarepaguá. É evidente, face ao exposto acima, que o dito Mosteiro não possuía qualidade para tanto, eis que as terras acima eram devolutas. Com efeito, não havendo elas saído validamente do patrimônio público, conforme se demonstrou exaustivamente, o dito Mosteiro sobre elas não possuía domínio, sendo-lhe ilícito, como é evidente, vender a terceiros o que não era seu. Acresce salientar-se, neste ponto, que o dito Mosteiro nem sequer poderia se utilizar, como simples posseiro, das vantagens conferidas pelo acima referida Lei n.º 601 (a Lei de Terras) e pelo seus regulamento, pois, por força dos preceitos trazidos à colação no § anterior, ele não poderia jamais obter para si domínio sobre as terras da Baixada. Estamos, portanto, perante hipótese de venda a “non domino” e, como tal, nula.

22.  Êste título, aliás, possue uma característica que demonstra claramente ser ele inválido. Conforme tivemos oportunidade para assinalar nos §§ 14 e 18 do presente, acima, quando Gonçalo Correia de Sá e Martim de Sá requereram e obtiveram a sesmaria por eles desejada na Baixada de Jacarepaguá, descreveram com exatidão as lindes da mesma, eis que apontaram como seus confrontantes tanto a sesmaria de propriedade da Ordem dos Jesuítas, como a sesmaria de propriedade do então Senado da Câmara, antecessor do atual Estado da Guanabara. Diga-se de passagem, que tais sesmarias são contíguas, conforme se pode verificar da obra de Haddock Lobo denominada “Tombo das Terras Municipais” (Rio, 1863, fls. 124/129). Pois bem, no título ora em exame, por motivos que a todos são evidentes, descreveu-se a área da antiga sesmaria como sendo:

uma linha de todas as vertentes dos morros pelos fundos” (fls. 96 dos autos).

Trata-se, em bom português, de uma simples impossibilidade, pois ambas sesmarias acima referidas ultrapassam de muito as vertentes dos morros, atingindo a parte plana da Baixada, conforme ressalta de simples inspeção da planta junta como documento n.º 2. Eis como se desmascaram “grilos”

23. A QUINTA FALHA NA CADEIA SUCESSÓRIA – Outra falha ainda é de ser devidamente ressaltada pelos interessados. Trata-se da manifesta desobediência ao preceito contido na Lei de 9.12.1830, a qual proibia terminantemente a venda de bens imóveis a ordens religiosas sem a prévia audiência do Governo; vejamos os seus termos:

São nulos e de nenhum efeito, em Juízo ou fora dele, todas as alienações e contratos onerosos feita pelas Ordens Regulares sobre bens imóveis, móveis e semoventes do seu patrimônio, uma vez que não haja precedido expressa licença do Governo para celebrarem tais contratos”.

Esta norma foi mantida pelo art. 5º do Decreto n.º 119-A, de 7.1.1890, pelo qual se efetuou a separação entre Igreja e o Estado, somente vindo a ser revogada pelo art. 3º, letra J, da Lei n.º 741, de 26.12.1900, isto é, posteriormente à realização da escritura de compra e venda em tela. Consequentemente, não havendo sido obtida a indispensável licença do Governo por parte do Mosteiro de São Bento, este não podia alienar as terras (admitindo sempre “gratia argumentandi” que fossem suas) a terceiros.

24. A QUESTÃO DO REGISTRO DO TÍTULO – Dir-se-á, entretanto, estar o título do Banco de Crédito Móvel transcrito há mais de 30 anos, o que lhe daria eficácia completa, eis que prescrita qualquer ação de nulidade do mesmo. Trata-se, entretanto, de ponto de vista insustentável no que tange à transcrição efetuada por terceiros sobre bens públicos, sem que para tanto possuam justo título, conforme passaremos a demonstrar. Em primeiro lugar, é de assinalar-se não possuir fundamento jurídico o ponto de vista segundo o qual a transcrição do título constituiria em favor de seu beneficiário um presunção “juris et de jure” relativamente à validade do título, ponto de vista esse que surgiu entre nós por haver impressão de que o Código Civil inovara em tal matéria acerca do direito anterior; é conhecida a monografia de Lisipo Garcia, que, infelizmente, difundiu essa opinião desprovida de base, a qual, ainda hoje, faz gerar consequências funestas nas relações jurídicas. Com efeito, o legislador nacional instituiu, no art. 859 do Código Civil, “in verbis”:

presume-se pertencer o direito real à pessoa em cujo nome se inscreveu ou transcreveu”.

Regra semelhante àquela constante do art. 891 do Código Civil Alemão, a saber (na tradução da Societé de Législation Comparée: Coce Civil Allemand, vol. 2º, Paris, 1.906, p. 490):

1’ inscription d’um droit au Livre Foncier emporte présomption de 1’ existence du droit em la personne du titulaire”.

Não há nem pode haver qualquer dúvida a respeito. Faltou ao direito brasileiro, entretanto, a inclusão de uma norma no Código Civil declarando que tal presunção era “juries et de jure” e não mera presunção “juris tantum”. Essa regra existe inequivocamente no Código Civil Alemão, consistindo na primeira parte do seu art. 892, com a seguinte redação:

La teneur du Livre Foncier est reputée exacte au profit do colui qui ae quiert par acte juidique un droit sur un immeuble ou un droit grevant un droit de ce genre, a poins que inexictitude n’en soit connus de acquéreur”.

Esta sim, é uma norma instituidora de presunção “juris et de jure” (est reputée exacte”), bastante diversa do comando previsto no art. 859 do nosso Código Civil e do art. 891 do próprio Código Alemão.

25. Comentando essa matéria, o Prof. Soriano Neto, na obra clássica a respeito (Publicidade Material de Registro Imobiliário, Recife, 1940) efetuou as seguintes considerações (pag. 161):

Ora, o Código Civil Brasileiro não conhece nenhum preceito semelhante ao do art. 892 do Código Alemão ou ao do art. 973 do Código Suisso, que consagram o princípio da fé pública. Logo, não menciona esse princípio; vigora, desse modo, no nosso direito, em sua plenitude, sem limitação ou exceção alguma (ao contrário do preceituam, em tais artigos, aqueles Códigos) a regra fundamental da legitimidade, que subordina a validade e eficácia da transcrição à existência de pressupostos jurídico-materiais: negócio jurídico obrigacional e faculdade de disposição do alienante”.

Aliás, é de salientar-se que Afonso Fraga já havia antes da publicação da excelente monografia do Prof. Soriano Neto, comprovado ser errônea a opinião de que o Código Civil Brasileiro adotara o sistema germânico da fé pública do registro imobiliário:

Ao contrário do germânico, pois, o sistema brasileiro não induz prescinde induzir prova absoluta do domínio e, nos termos do art. 859 do Código Civil, mera presunção …(omissis)”. (Direitos Reais de Garantia, São Paulo, 1933, pag. 459).

Após a brilhante publicação da obra do Prof. Soriano Neto a doutrina e a jurisprudência nacionais adotaram seu ponto de vista. Quanto à doutrina, basta trazer à colação o entendimento do emérito Orlando Gomes, em seu trabalho sobre os Direitos Reais (2ª edição, vol. 1º, pag. 190):

“O princípio da fé pública do registro é o que traduz o valor de sua prova. O direito pátrio formulou a seguinte disposição: “presume-se pertencer o direito real à pessoa em cujo nome se inscreveu ou transcreveu”. A natureza dessa presunção é controvertida, entendendo uns que é absoluta e outros relativa. Trata-se, evidentemente, de presunção “juris tantum”. Quem aparece como proprietário nem sempre o é. Se o registro não exprime a verdade, pode ser retificado. Consequentemente, seu valor jurídico não é absoluto”.

26. A JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS – Os nossos órgãos jurisdicionais vêm se pronunciando exatamente ora defendido pelo Estado. Veja-se, dentre muitos outros, o venerando acordão do Colendo Supremo Tribunal Federal, de que foi relator o eminente Ministro Laudo de Camargo[ii], no Recurso Extraordinário n.º 9.563, em grau de embargos (publicado na Revista Forense, vol. 111, pags. 390/391) e do qual se extrai o seguinte trecho:

Mas não menos certo que a presunção, decorrente da transcrição – de se a propriedade de quem a fez transcrever, é “juris tantum” e não “juris et de jure”. Admite, assim, prova em contrário, como se deduz dos arts. 859 e 600 do Código Civil.

O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo teve, igualmente, oportunidade para pronunciar-se a respeito da questão através acordão de autoria do eminente Ministro Mário Guimarães encontrado na Revista Forense, vol. 92, pag. 467 e que decidiu o Recurso de Revista n.º 11.563; dele são as seguintes considerações:

Não se pode, pois, nem pelo cotejo com o direito alemão, nem pela invocação dos trabalhos preparatórios, concluir que, no direito brasileiro, aquele em cujo favor está feito o registro tem por si uma presunção “juris et de jure”.

A matéria é pacífica, portanto.

27. Vamos agora à segunda parte da alegação resumida no § 24 do presente, acima, no sentido de se encontrar prescrita qualquer ação do Estado da Guanabara relativamente à obtenção de nulidade da transcrição efetuada pelo Banco de Crédito Móvel, em liquidação desde as calendas gregas. É de ver que tal ponto de vista, cuja alidade nada se terá a opor no que tange aos imóveis de propriedade privada, apresenta-se insuscetível de sustentação desde que aplicado aos imóveis de propriedade pública. Com efeito, o art. 67 do Código Civil outorgou aos bens públicos o caráter de inalienabilidade, excetuando apenas as hipóteses previstas em lei:

Os bens de que trata o artigo anterior só perderão a inalienabilidade, que lhes é peculiar, nos casos e forma que a lei prescrever”.

Sendo a inalienabilidade uma característica dos bens públicos, eles se encontram fora do comércio, tal como determinado pelo art. 69 do mesmo Código Civil, a saber:

São coisas fora do comércio as insuscetíveis de apropriação e as legalmente inalienáveis”.

Já vimos anteriormente que a Baixada de Jacarepaguá, pelos motivos então expostos, tornou-se terra devoluta e, como tal, bem público, encontrando-se fora do comércio. Não era ela, em via de consequência, legalmente capaz de apropriação por parte de terceiros, sendo que, caso exista qualquer ato nesse sentido, ele se apresenta como juridicamente inexistente, eis que não previsto no ordenamento jurídico em vigor. É este exatamente o caso dos autos. Encontrando-se fora do comércio os bens públicos, a Baixada de Jacarepaguá, que era terra devoluta, não podia ser objeto de apropriação por parte de qualquer pessoa, sendo manifestamente inexistentes os atos praticados que envolvam sua alienação do patrimônio público. Veja-se, a propósito, a decisão do Egrégio Tribunal Federal de Recursos prolatada na Apelação Cível n.º 17.529, publicada no Apenso no Diário da Justiça Federal de 9.4.1965, a fls. 170/180, sendo relator o eminente Ministro Hugo Auler. Pedimos vênia, a propósito, para citar os seguintes trechos da minuta de julgamentos:

Registro Público. A presunção de titularidade do direito real, resultante da inscrição ou da transcrição, é “juris tantum”, admitindo prova em contrário, quer se trate de adquirente de má fé, quer se trate de adquirente de boa fé, pois qualquer um daqueles atos formais não purga o vício do título, nem supre a faculdade de disposição. Interpretação do arts. 859-860 do Código Civil”.

Continuidade do Registro. Não pode alegar a seu favor a presunção “juris tantum” do Código Civil aquele que obteve a transcrição do título de transmissão aparente de direito real sem que este registro imobiliário resultasse de uma cadeia causal de transcrições, na conformidade do art. 244 do Decreto n.º 4.857, de 9 de novembro de 1839, com a redação que lhe foi dada pelo art. 1º do Decreto n.º 5.318, de 29 de fevereiro de 1940.

Transcrição. Ineficácia. A transcrição é um ato inexistente, sem capacidade para produzir quaisquer efeitos jurídicos, desde que fundada em título aparente de transmissão de propriedade de bens públicos sem que a lei permita a alienação, pois, nesta hipótese, a “publica fides” do registro é apagada pela ineficácia absoluta da transcrição”.

Em anexo, como documento n.º 3, encontram-se o venerando acordão em tela.

28. CONCLUSÃODo exposto segue-se que as terras objeto do presente pedido de averbação em transcrição pertencem ao Estado da Guanabara, eis que são terras devolutas e estas, conforme o disposto no art. 5º da Constituição do Brasil, de 1967, são de propriedade da referida pessoa jurídica de direito público territorial”. (…)

Rocha Lagoa

Procurador do Estado

Adv. N.º 6.287

 

Fonte: Arquivo Nacional: BRDF AN BSB 1M.151.1


[i] Salema teve por pais a Diogo Salema e sua prima Caterina Salema. Foi licenciado em leis, e um dos primeiros colegiais do Colégio Real de São Paulo, em Coimbra, admitido a 2 de maio de 1563. Depois de ler uma catedrilha de instituta subiu à Cadeira do Código no ano de 1567, onde ditou a Postila ao Tit. Cod. de Fide instrumentorum, e outra ao Tit. Plus valere quod agitur, quam quod simulate concipitur.

Depois de ser Desembargador da Casa da Suplicação, de que tomou posse por seu procurador, o Desembargador Diogo Lameira em 16 de março de 1570, foi mandado com uma alçada a Pernambuco por ordem do Rei D. Sebastião de Portugal, e depois de concluída esta incumbência, foi nomeado governador de São Tomé e depois governador do Rio de Janeiro. Em 1578, organizou uma expedição contra os franceses, que haviam estabelecido a Feitoria Maison de Pierre em Cabo Frio para exploração de pau-brasil, da qual participou Antônio de Mariz, um dos fundadores da cidade do Rio de Janeiro.

Voltando ao Reino de Portugal, foi nomeado Desembargador dos Agravos em 19 de fevereiro de 1583. Faleceu em Lisboa e está sepultado no Convento de São Francisco da Cidade.

Casamento:

Casou com D. Luísa de Siqueira, filha de Afonso Bicudo e de Isabel de Siqueira, a qual, enviuvando, casou com Francisco de Almeida de Vasconcelos, Secretário de Estado de Portugal em Madrid.

Obra:

Escreveu o Tratado da conquista que fez do Cabo Frio contra os franceses e o gentio tamoio que nele estavam fortificados.

Bibliografia:

Biblioteca Lusitana, de Diogo Barbosa Machado, tomo I, página 383.


[ii] Laudo Ferreira de Camargo (Amparo, 17 de abril de 1881 — Rio de Janeiro, 21 de julho de 1963) foi um advogado, magistrado e político brasileiro. Bacharelou-se pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, turma de 1902. Advogou em sua cidade natal até, em 1905, ser nomeado promotor público da comarca de Serra Negra. Em 1908, removido para São José do Rio Pardo quando foi nomeado juiz de direito de Itaporanga em 1910, Cajuru em 1911, São Simão em 1912, Ribeirão Preto em 1915, e Santos em 1922. Mediante nova promoção foi elevado a juiz de direito da capital, em 1927. Sobrevindo o movimento revolucionário de 1930, um dos primeiros atos do novo governo foi mudar a composição do Tribunal de Justiça paulista, forçando alguns magistrados à aposentadoria e nomeando outros sem ligação com o governo do Partido Republicano Paulista. Coube a Laudo de Camargo ser agraciado com um lugar na terceira câmara do citado tribunal. Assim o novo ministro foi empossado no dia 27 de novembro de 1930, no gabinete do presidente Manuel Policarpo. Foi interventor federal no governo de São Paulo, de 26 de julho a 13 de novembro de 1931. Foi nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal pelo Presidente da República Getúlio Vargas, mediante decreto de 30 de maio de 1932, na vaga resultante do falecimento de Francisco Cardoso Ribeiro, assumindo o cargo em 9 de junho. Foi eleito presidente, de 31 de janeiro de 1949 a 17 de abril de 1951, quando, completando setenta anos, aposentou-se compulsoriamente.

Relatório Confidencial do SNI sobre a Grilagem de Terras na Barra da Tijuca

Em nossas pesquisas junto ao Arquivo Nacional, encontramos o documento em anexo que confirma a tese de que Pasquale Mauro, principal cabeça do Banco de Crédito Móvel (entidade fictícia, sem personalidade jurídica e existência de fato), tenha sido um dos maiores grileiros do Brasil.

A curiosa narrativa expõe um esquema de grilagem de terras sofisticado, até mesmo para os dias de hoje, na medida em que as fraudes perpetradas no passado vão se eternizando com a chancela insensível de alguns juízes.

Veja um breve recorte do documento, e um sinal do que se será exposto nas próximas publicações. Não se trata simplesmente de grilagem de terras, mas de uma das muitas faces da corrupção sistêmica que afeta o país:

“A procedência trazida pelos pretensos proprietários não é advinda de título legítimo de aquisição e, muito menos, de concessões de posses devidamente revalidadas ou legitimadas, respectivamente. Provém ela de escritos forjados, contraditórios, enfim de nenhum valor jurídico (…)”. 

 As figuras sinistras de PASQUALE MAURO e HOLOPHERNES CASTRO, este último já falecido, representam os maiores esbulhadores das terras de uma região da mais valorizadas do BRASIL, os quais, desde 1934, por meios não muito claros e uma documentação duvidosa, se dizem donos das vastas terras, desde a BARRA DA TIJUCA até o PONTAL DE SERNAMBETIBA, em GUARATIBA. Os nominados, temerosos pela precariedade de seus direitos e oriundos de uma documentação espúria e proveniente de uma sociedade inexistente, resolveram, por escritura pública do 22º Ofício de Notas encerrar as atividades e extinguir a sociedade BANCO DE CRÉDITO MÓVEL, de forma amigável, por inexistir estrutura jurídica e dividiram entre os acionistas minoritários um capital social de terras inexistentes, ficando as terras para os sócios PASQUALE MAURO e HOLOPHERNES CASTRO (…).

 PASQUALE MAURO se diz protegido de autoridades civis, policiais e judiciárias:

da civil, por explorar irregularmente extração de areia quartzo às margens da BR-6 até o canal de SERNAMBETIBA, sem dar cumprimento ao contido no Decreto-lei n.º 227 de 28 FEV 67, não sendo fiscalizado pelos órgãos competentes;

da policial, por não ser molestado quando invade áreas confiantes com as suas;

da judiciária, por ter trânsito livre em gabinete, inclusive com cartão de estacionamento para uso de dois carros no pátio do Palácio da Justiça, enquanto funcionários do Judiciário não o possuíam”.

SNI – Relatório Confidencial – Arquivo Nacional (clique aqui para baixar o documento)